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Efeito de flutuação de texto ...:::JOÃO VITHOR E NICOLE:::...
Fórmulas especiais gratuíta é um direito da criança.
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domingo, 28 de julho de 2024

O peso da ansiedade

 A ansiedade é uma condição frequentemente mal compreendida. Muitas pessoas que se consideram ansiosas não têm plena noção do que é conviver com a ansiedade patológica, nem do impacto que ela pode ter sobre quem está à sua volta. Essa condição afeta não apenas o indivíduo, mas também seus familiares e amigos mais próximos.

Nicole é um exemplo extremo de ansiedade. Para ela, não se trata apenas de uma inquietação temporária diante de um evento importante. Sua ansiedade vai além de uma noite mal dormida antes de uma viagem ou da expectativa pelo Enem. O aniversário de Nicole é em setembro, mas desde cinco meses antes ela já começa a sofrer. Planeja várias coisas, mas seu cérebro fica tão agitado que ela não consegue parar de pensar sobre o assunto. Inicialmente queria uma festa, depois mudou para um dia no shopping com as amigas, e agora só quer um presente, mas que seja imediato. Imagina só? Ganhar o presente de aniversário meses antes.

Nas últimas duas semanas, Nicole tem perguntado diariamente o que vai ganhar de aniversário. Ela já pediu várias coisas e mudou de ideia inúmeras vezes. Ontem, ela fez um piquenique com as amigas. Na semana anterior, passou por um turbilhão de emoções: chorou, pulou, mudou de humor, quis desistir, ligou várias vezes para as amigas, quis saber o que cada uma levaria de jogos e lanches. Desde segunda-feira, ela pediu para eu preparar um lençol para sentar na grama, copos descartáveis e separar os jogos que levaria. Com a expectativa do aniversário e do piquenique, já tem semanas que ela não tem dormido bem, acordando de madrugada e levantando cedo. Às vezes, ela vai ao meu quarto de madrugada e pede para eu acordar e ficar com ela.

Quando há um compromisso às 17h, Nicole já está ansiosa às 6h, batendo na porta do meu quarto. Às 10h, está vestida e pronta para sair, e às 14h, já quer que todos estejam prontos. Quando compramos algo pela internet, como na Shein, ela já começa a rastrear o pacote uma hora após a compra e vigia o carteiro pela janela. Se o interfone toca, mesmo que seja para outro apartamento, ela acha que é um problema com o interfone e já grita o carteiro para pedir informações.

Ela chora pela demora, fica irritada e quer que eu ligue para os Correios. Em dias especialmente difíceis, Nicole acorda falando sem parar. Hoje foi um desses dias. Em uma hora, ela trocou de assunto nove vezes e quer que eu responda a tudo, não importa se sei a resposta ou não. Se alguém promete algo, mesmo que seja um pirulito, ela vai cobrar muitas vezes, às vezes até de madrugada, e também ficará esperando pela janela.

A ansiedade de Nicole faz com que ela queira alimentos mal cozidos por não conseguir esperar o tempo de preparo. Fazer um picolé é quase impossível, ela acaba tomando suco gelado, pois não espera congelar. Quando saio de casa, ela me pergunta constantemente se estou chegando, e isso quando não chora pedindo para eu não ir. Toda essa tensão gera sofrimento para Nicole, que muitas vezes chora ou briga sem parar. Eu tento evitar promessas e declarações que possam gerar mais ansiedade nela. Ela não me deixa descansar, ir ao banheiro ou fazer qualquer outra coisa sem ser chamada a cada cinco minutos. Suas muitas perguntas e pedidos sem nexo exigem que eu esteja sempre disponível.

Essa situação me causa vários problemas, como esquecer compromissos e errar receitas, devido à sua constante pressão em cima de mim para que eu ajude. A ansiedade de Nicole me afeta diretamente e mesmo ela sendo medicada, com várias psicotrópicos e fazendo terapias todos os dias, ela não tem apresentado uma boa resposta.

Então, se você consegue esperar o arroz cozinhar, a gelatina endurecer ou alguém acordar, parabéns! Talvez você não seja tão ansioso quanto pensa.

quinta-feira, 2 de maio de 2024

Um caminhada solitária


Sou mãe de uma menina autista que possui uma doença metabólica com alteração em varios sistemas. Sou autista. Ser mãe atípica é sinônimo de andar sozinha. Ser autista também. Ninguém tem a disposição de andar por onde andamos. É uma estrada solitária e escura.

Bem lá no começo da minha caminhada, nas primeiras internações, nas primeiras dificuldades, tive a presença de alguns familiares e amigos. Depois, quando entrar e sair de hospitais, UTI e centro cirúrgicos, virou algo rotineiro, a presença ficou escassa. Quando minha rotina é ir todos os dias da semana para terapias, ausência assumiu o lugar dos pouquíssimos que ainda fingiam ser presente. 

Todos os dias enfrento o dilema de escolher qual compromisso priorizar: terapia, consulta médica ou exame. Sou cobrada por assiduidade em todos os lugares, enquanto eu mesma preciso de cuidados médicos e terapias

E como se não bastasse, ainda temos que lidar com o julgamento de pessoas que associam nossa jornada à falta de Deus, fé ou algum pecado. Como se estivéssemos na Idade Média, onde doenças eram vistas como castigo divino.

É cansativo ouvir que a cura da minha filha depende da minha fé. Colocando em mim, a responsabilidade dela precisar de cuidados médicos. Todo mundo adoece. Os hipertensos usam medicamentos contínuos, os diabéticos também. Porém só a minha filha que precisa do milagre da cura. Na Bíblia fala que o mar se abriu para Moisés passar mas também fala que Jesus chamou Pedro para andar por sobre o mar. A minha fé tem nos levado além das expectativas dos médicos. Como podem dizer que não somos abençoados por Deus? Nós somos da turma que tem andado sobre o mar, e tudo bem! Porque Jesus também está conosco. Ele não abriu o mar mas também não me deixou parada do outro lado. Estamos caminhando,  avançando dia após dia. 

Muitos não sabem que todos os dias da vida da Ni,  até hoje, são milagres.  Ela ter seu tratamento é um milagre, é Deus cuidando dela. 

Um dia, uma enfermeira do nosso plano de saúde perguntou se nosso advogado era muito bom, respondi: _ É Deus! 

Ela perguntou se ele era tão bom, que eu o considerava um Deus,  disse a ela que não,  que sempre foi Deus cuidando e usando as pessoas para serem abençoadores da vida da Ni. Com certeza nosso advogado também foi usado por Deus.

Graças a Deus minha filha está fazendo seu tratamento,  precisei lutar muito porém a todo tempo lidamos com os pedregulhos no meio do caminho. São várias tentativas de cessarem o fornecimento do tratamento. Tem os levantes, pessoas que miram diretamente na nossa honra e tentam nos denegrir. Algumas falas são pesadas, cruéis, tentando nos fazer parar.

Já ouvi de um médico pediatra que eu estava sendo castigada com a minha filha sofrendo e pela morte do meu filho. E mesmo diante de tanta ignorância, preciso seguir.

Sempre digo, o plano de saúde é benção na vida da Ni, mesmo sendo resistente em fornecer o tratamento,  mesmo nos atormentando o tempo todo. O tratamento dela é caríssimo, hoje em dia nós custeamos algumas necessidades que o plano negou e ainda assim temos dificuldades em custear, precisando sempre fazer uma rifa ou vakinha.

É cansativo ter que pedir ajuda o tempo todo. nem todos entendem que existem outros gastos além do tratamento: calçados especiais, órteses, alimentação específica, medicamentos... E eu também tenho minhas necessidades e restrições alimentares.Não temos ajuda do governo com loas ou qualquer outro benefício. Apesar das dificuldades, seguimos em frente, lutando por cada conquista.

Essa é a nossa jornada, uma estrada solitária e escura, mas iluminada pela fé e pelo amor.