Uma reflexão do passado em cima do presente.

''Antes de julgar a minha vida ou o meu caráter... calce os meus sapatos e percorra o caminho que eu percorri, viva as minhas tristezas, as minhas dúvidas e as minhas alegrias. Percorra os anos que eu percorri, tropece onde eu tropecei e levante-se assim como eu fiz. E então, só aí poderás julgar....'' (Clarice Lispector)

Tenho lido com muita frequência essa frase a enfeitar páginas pessoais em alguns sites. Vejo pessoas que já usaram os sapatos , já percorreram todo o caminho , viveu todas as tristezas e sentiu todas as dúvidas e alegrias , que tropeçou , caiu e levantou e hoje em dia vejo essas pessoas que conseguiram chegar ao seu destino julgando quem vem logo atrás iniciando o caminho do medo e dor , calçando os sapatos da humilhação e tropeçando em suas dúvidas e tristeza e caindo. 

Quando iniciei nesse caminho da alergia estava tão perdida, eu uma menina boba e sem noção de quanto o mundo era grande tentando desesperadamente alimentar meu primeiro filho que dependia de um alimento tão caro. Com muito esforço conseguir o direito de receber o leite mas ainda me recordo com a mesma emoção o dia que a assistente social nos visitou e por sorte ainda tínhamos um banco de madeira para que ela sentasse e preenchesse uma ficha. Lembro que ela olhou ao redor e perguntou , cadê o fogão, a geladeira? Meu marido sempre trabalhou com informática e na ocasião ela viu a carcaça de um computador e perguntou   se tínhamos internet e mostrei p ela que todas as peças foram vendidas , uma a uma de forma a render mais dinheiro e só restava a carcaça de uma ferramenta de trabalho. Outro momento de grande emoção foi o dia que deitei com o João para faze lo dormir e assim alimenta lo com sono pois o leite estava no fim e não tínhamos previsão de R$ na ocasião e ele dormiu, eu dormi e de repente chega meu marido esbaforido em casa com caixas de pregomin. Uma emoção sem tamanha invadiu meu coração, deve ser assim que um ganhador único de loteria deve sentir, a pessoa mais rica do pedaço. Na ocasião acordei o João e ofereci o seu mama me sentindo a pessoa mais feliz do mundo. Mesmo com essa vitória a vida continuou difícil e dolorosa e depois de uma internação de 30 dias João retorna a casa precisando do aminomed e ai nesse ponto meus sapatos começaram a fazer calos dolorosos. Como alimentar o meu filho? Nessa época já tínhamos conseguido com muito esforço e ironicamente em troca de serviços um computador. Sinceramente não me lembro onde e como conheci dezenas de pessoas mas orientada por uma amiga de orkut fui a uma comunidade com assuntos relacionados a pediatria e abri um tópico perguntando se alguém teria AMINOMED para dor, vender ou emprestar até o meu sair via prefeitura. Na ocasião muitas pessoas nos ajudaram e diante de tanta ajuda me senti a vontade em relatar um pouco do nosso dia a dia e de nossas lutas. Fui muito ajudada graças a Deus e sou grata por isso. Muitas coisas aconteceram e outra ocasião abri um tópico relatando minha preocupação com o futuro do João diante dos dizeres da própria médica durante a consulta. Novamente fui ajudada a procurar um especialista fora de Goiás. Com muito medo fui a outro estado e passei por outros médicos e nada mudou. Nesse período fui orientada a dar rã ao João e uma pessoa nos ajudo a conseguir carne de rã e depois de muitas coisas foi levantado a possibilidade de irmos ao SP. Fomos ficamos 1 mês e voltamos para Goiânia com a nossa vida já pré programada pelo anseios de algumas pessoas em ajudar. Fomos ''morar'' em SP e quem estava próximo a mim nesse período sabe o quanto relutei em ir para lá, quanto medo eu senti e como foi doloroso  deixar minha casa e ir confiada em pessoas que só conhecia por internet mas que haviam nos ajudado financeiramente. Fui porque havia recebido ajuda e ''devia'' isso as pessoas. Se desistisse poderia soar mal. Fui, e lá foi horrível, coisas aconteceram e tivemos que voltar e ai começou uma fase dolorosa em nossas vidas. As pessoas que nos ajudaram ouviram uma versão da historia e além de tudo fizeram um pré julgamento do meu jeito ( jeito tdah, triste e apreensiva com as mudanças) e baseado nisso fizeram um verdadeiro lixamento virtual em várias comunidades fechadas. Fomos humilhados , xingados de nomes horrorosos, ofendido em nossa moral e dignidade chamados de loucos, 171 e até morte nos desejaram. Foi uma época terrivelmente difícil,  e nesse período tenebroso  contei com a amizade de algumas pessoas e isso foi um grande apoio para continuar e seguir de onde havíamos parado. Essa fase deixou marcas tão profundas que ainda hoje se notam diante de algumas situações, essa fase terrível quase me matou e quase matou ao meu filho que sem tratamento em Goiânia , iniciamos com um nova médica, sem credibilidade , tive que deixar que algumas introduçoes alimentares fossem feitas e sofria ao ver meu filho definhando dia a dia , comia pratos e pratos de comidas e só perdia peso, infecções a cada 48h sem antibiótico , várias internações, muitas agulhadas e muita dor e tive que fecha os olhos para a dor e deixar que os médicos percebessem que a comida que tantos nos faz bem era um verdadeiro veneno para uma criança alérgica, para o João Vithor. 

Hoje muita coisa mudou, eu mudei mas a alergia continua a mesma. Sei que hoje em dias algumas pessoas que tanto nos julgou já me dão o benefício da dúvida outras são orgulhosas demais para reconhecer que agiram errada e que cometeram um crime, dessas tenho nojo. Ainda tenho os prints dos insultos ditos nas comunidades e sei que preciso deletar isso da minha vida. Doeu muito e hoje ao lembrar também doeu e é por isso que não posso e não devo e não irei julgar uma pessoa que não conheço, que nunca vi na vida. Aprendi que Deus é o único que pode nos julgar e sentenciar somente ele é perfeito. Entendi que tudo que passei , não passei só, Deus esteve ao meu lado e colocou verdadeiros anjos ao meu lado que não permitiram que eu ficasse no chão.

  Não devemos tirar conclusões precipitadas e se não conseguimos compreender não devemos julgar. No final tudo tem o seu propósito revelado.